quinta-feira, 22 de abril de 2010

Quinta-Feira.

Esse não é nenhum conto de fadas, muito menos de fodas. Estas podem estar subentendidas. Nada novo, nenhuma história incrível. É somente um relato piegas do que aconteceu a uma mulher não havia percebido ainda esta sua condição. 

Trabalhava quando tinha vontade. E assim era com tudo na vida. Não gostava de fazer nada por obrigação. Certamente que isso acarretava problemas: dívidas, preocupações, atrasos. E olhares de desprezo, pois todos pareciam quase se matar de tanto levar a vida seriamente, enquanto ela não se ocupava de nada com mais afinco. E vivia. Saía, se divertia, bebia, conhecia, ria. Era feliz. As preocupações, por maiores que fossem, nunca tiravam seu sono. Suas olheiras resultavam de noites boêmias, não de problemas que a impediam de dormir.
Dormir lhe era sagrado, aliás. Era o que mais gostava de fazer. Mas preferia dormir numa segunda feira à tarde do que num final de semana. Gostaria de trabalhar em casa, pra não ter de sair enquanto o céu estivesse claro. Não suportava a luz. Dias ensolarados a incomodavam. O sol lhe dava dor de cabeça e bolinhas pelo corpo. Às vezes se lembrava da lenda do lobisomem: o sétimo filho seria um. Se ela fosse homem, seria um. Não! Se fosse pra ser um ser noturno, preferia ser vampiro. Não suportaria ter a bunda peluda!
Vampiros são pálidos, elegantes e chegam a ter um apelo sexual muito interessante. Os lobisomens são tortos, peludos e têm as unhas sujas. Ninguém gostaria de transar com um lobisomem. E sempre via cenas de vampiros em bibliotecas. Os lobisomens estão sempre soltos pelas ruas sem rumo. Isso era interessante. Somente isso. Os vampiros são cultos, eloqüentes, articulados. Convencem com a fala e com o olhar. Os lobisomens só uivam. Assustam. Os vampiros seduzem. Quando se percebe, é tarde demais. Não adianta mais se assustar, pois o mal já está feito.
Vida eterna não lhe era atraente. Essa já estava comprida demais. Uma rotina infindável: trabalhar (pouco) e beber (muito). Mais nada. O restante não lhe agradava. Nem as pessoas que sempre estavam com ela, porque a amavam, nem as conversas fúteis que tinha, nem as conversas interessantes. O bar já não era mais agradável. Sua casa não mais parecia sua. Precisava de alguma mudança rápida, mas o que lhe incomodava não sumiria do dia para a noite. Não via saída, a não ser se entregar àquele sentimento de inutilidade e ir se arrastando pelos dias.
Num domingo bonito resolveu ir a um bar diferente com a amiga. Esta conhecia a todos ali. Ela se sentia meio deslocada. Tomava sua cerveja em seu canto enquanto a amiga ia de um lado para outro, cumprimentando a todos e flertando com alguns. Durante a tarde a menina se apaixonou três vezes. Não deu certo com nenhum.
Anoiteceu e resolveram ir para o bar de costume. Enquanto se encaminhavam para o carro, a amiga viu dois caras sentados na calçada e disse que queria um deles. Ela esbravejou, pedindo para que a amiga se aquietasse e entrou no carro. A moça entrou também, com cara de insatisfeita. Vendo isso, ela parou o carro em frente a eles e disse que estavam indo para o outro bar, chamando-os para ir também, porque a amiga inquieta queria conhecer o fulano. Ele se levantou e foi falar com ela, mas ela o mandou para o outro lado, porque a história era com a amiga, não com ela.
Foram todos para o bar, os dois se entenderam e ela, como de costume, ficou bebendo em seu canto.
Ele era estranho, parecia um desenho. Tinha uma voz grossa, que soava artificial. Não era o tipo de homem que lhe chamaria atenção em situação alguma, por maior que fosse o porre. Mas a amiga gostou. Ele parecia ter gostado dela também. Então, apesar das gozações com a amiga, os dois se entenderam. Era isso que importavam. Entenderam-se por aquela noite.
Durante duas semanas ela se ocupou de zombar a amiga. Ela já tinha conhecido outro, já tinha deixado aquele de lado, mas ainda era motivo de escárnio.
Numa sexta feira nossa heroína foi visitar outra amiga, para cumprimentá-la pelo seu aniversário. Bem, sejamos realistas: ela foi à casa da amiga aniversariante para dar um abraço nela e pra beber o que tivesse ali. Beberam e conversaram por algumas horas. Sempre surgiam umas conversas sérias quando se juntava com esta amiga. Cada uma com seus problemas, tentando resolver o problema da outra. E a conversa durou até a uma e meia, quando sua irmã ligou perguntando se ela não iria pro bar. Resolveu ir embora, mas só daria uma carona pra irmã. Não ficaria lá. Depois da conversa, resolveu ser um pouco mais responsável e percebeu que já não tinha mais idade pra se portar feito uma adolescente.
Levou a irmã até o bar e desceu do carro pra tomar a última cerveja da velha vida. Assim que chegou encontrou o cara que tinha ficado com a amiga. Antes de perguntar se ela estava bem, praxe quando as pessoas se cumprimentam, ele perguntou por que a amiga não tinha ido. Ela explicou e saiu.
Encostada no balcão conversava com o dono do bar enquanto bebia. Ele se aproximou e puxou conversa. Ela tomou mais um ou dois copos e saiu pra fumar. Em alguns segundos ele também estava lá fora. Mais uma vez puxou assunto, até o momento em que ele começou a dizer que, na verdade, tinha gostado era dela...
“Pronto, mais um idiota com conversa mole. Pegou a menina e agora acha que eu caio nessa...”
Ela desconversou e entrou. Logo ele entrou também. Ficaram nesse jogo de gato e rato algum tempo. Ela tentando correr e ele insistindo. Ela imaginava o que tinha feito pra merecer aquilo: um cara estranho, que tinha ficado com amiga, atrás dela. “Tanto homem no mundo e justamente esse resolveu me enxergar”.
Apesar de querer fugir, ela não lembrou, em nenhum momento, que tinha ido até lá pra tomar uma cerveja somente. Ela não pensou, nem por um instante, que poderia ir embora e deixar tudo como estava. Ela não queria ir embora. Não queria fugir. Estava gostando da conversa, estava gostando das investidas dele.
Ele falava sobre seu vestido, suas pernas, seus cabelos... Seus olhos e sua boca... Falava muito mais e tudo que ele dizia era o que ela precisava ouvir. Sua voz já não era mais artificial. Aos seus ouvidos soava como um mantra que convidava a algo mais íntimo. Eram três e meia da manhã quando ela desistiu de ouvi-lo. Puxou-o para si e lhe deu um beijo, segurando-o pela gola da camisa. Ele parecia não acreditar no que havia acontecido. A partir daí foram beijos e elogios, abraços e carícias... Eles estavam prestes a sair dali quando a irmã dela apareceu, lembrando-a de que tinha que levar mãe em algum lugar às cinco da manhã.
Acabou a brincadeira. Eles combinaram de se ver no outro dia. Encontraram-se no bar onde se conheceram. Estavam ali uns amigos que ela não via há tempos. Sentou para tomar uma cerveja com eles, pensando que ele não gostaria muito da ideia. Ao contrário: se deu tão bem com eles como se fossem seus amigos também.
O que aconteceu mais tarde naquele sábado é melhor não publicar. Talvez esta narradora que vos fala faça isso um dia, como se fosse uma história à parte e fictícia. Essa história aqui só trata dos detalhes bobos.
No domingo pela manhã ela foi embora. Chegou em casa e ligou para a amiga pra pedir permissão pra ficar com ele. Contou a história e a amiga ficou feliz. Por eles. Depois ligou para a outra amiga e contou como estava contente e detalhou tudo que havia acontecido. Arrumou algumas coisas em casa, tomou um banho e voltou para o bar. Encontrou outro amigo, do qual nenhum de seus ex-namorados gostavam. Ela dizia em alto e bom som que amava aquele menino. E os namorados sempre tinham ciúme dele. Mas com esse foi diferente. Ele não só gostou do amigo como se esqueceu dela e ficou conversando com ele por um bom tempo...
Nesse bar, todos os conhecem. E falam muito bem dele. Alguns a conhecem de criança, ou conhecem os irmãos mais velhos. Todos ali parecem estar em família, e ela sente como se fizesse parte dela. Quem sabe não ganha um colete um dia desses?
No outro bar, o que ela freqüentava, todos a conhecem. E falam muito bem dela pra ele. Certa vez ele disse que se sentia à vontade ali pois todos já o tratavam pelo nome, pois sabiam que era o namorado dela.
- Namorado?! – perguntou ela, surpresa.
Namorados. Nunca pensou que acharia essa palavra tão doce.
O final da história todos devem imaginar. Ele confirmando o que queria, ela aceitando... Eles juntos agora, nos dois bares.
As noites continuam atraentes, mas agora os amanheceres são especiais.
Seus planos de parar de sair não deram certo. Continua saindo, até mais do que antes. Agora tem de freqüentar os dois bares. Um até as onze e outro depois que o primeiro fecha. Além disso, ainda tem a ‘difícil’ tarefa de dormir com ele depois da gandaia. Tem de ir pra casa dele todo final de semana. Fora a caixa de mensagem do celular cheia, as ligações que recebe só pra não se esquecer de que é amada, a saudade que dá assim que o carro vira a esquina e a quinta feira que se tornou o pior dia da semana, pois parece que adia a sexta o quanto pode!

Um comentário:

Juan Moravagine Carneiro disse...

Seu blog já voltou para a lista...rsr.s..